Revista Consultor Jurídico, 2 de novembro de 2012
O protesto fiscal é a modalidade de cobrança de dívidas públicas através
dos cartórios extrajudiciais. Alguns setores alegam que é
ilegal/inconstitucional por falta de lei específica autorizando o setor estatal
usar esta via. Mas, este argumento é o mesmo que sustentar que o Estado não pode
alugar, comprar, vender, nem expedir boletos de cobrança, além de inúmeros
outros atos, em razão de ausência de lei específica para a área estatal.
A lógica do direito administrativo é que o administrador somente pode fazer
o que está previsto em lei, mas não exige que seja uma lei específica para o
setor público. Assim, a cobrança de dívidas por meio do Cartório Extrajudicial
tem previsão na Lei Federal 9492/97.
Logo, pode o Estado optar pela cobrança através da Execução Fiscal ou então
pela Cobrança Extrajudicial através do boleto bancário ou do protesto fiscal, e
neste caso o Cartório fará uma análise prévia da legalidade do título.
O Brasil é o único país do mundo que se entende que o Estado pode cobrar
dívidas apenas através do sistema judicial e esta situação beneficia apenas
alguns setores como demonstraremos.
Hoje, 30% das ações judiciais no Brasil são na modalidade execução fiscal,
e a cada ano ajuízam mais de 20 milhões de execuções fiscais (Municípios,
Estados e União). Cada Execução Fiscal custa aproximadamente R$ 4.000,00
(conforme estudo IPEA), logo não faz sentido executar débitos abaixo deste
valor. O índice de sucesso das Execuções Fiscais é menor que 20%. Já o devedor
tem que pagar no mínimo R$1.000,00 (um mil reais) de custas, além dos honorários
dos advogados, o que paga duas vezes, uma vez que paga os honorários de
sucumbência aos advogados da fazenda pública e os honorários contratuais aos
advogados contratados para a defesa.
Já o protesto fiscal não tem custo algum para o Estado, pois quem assume as
despesas é o Titular do Cartório de Protestos. Em geral, o custo dos emolumentos
para o devedor será de R$ 100,00 (cem) reais, e não será obrigado a contratar
advogado para defender.
O protesto fiscal costuma ter 80% de êxito, sendo que 50% das dívidas são pagas em menos de 10 dias.
O protesto fiscal costuma ter 80% de êxito, sendo que 50% das dívidas são pagas em menos de 10 dias.
A União tem a receber um trilhão de reais, o que representa um quarto do
PIB nacional, isto é significativo e não pode ficar parado em razão de
interesses corporativos de se manter reserva de mercado de trabalho.
O mesmo setor que alega que o Governo é o maior demandante, é o mesmo que
deseja a manutenção da execução fiscal judicial. A rigor, setores de carreiras
jurídicas não querem a desjudicialização (meios extrajudiciais), pois temem que
outros setores administrativos possam fazer esta cobrança.
Se um prefeito optar por fazer uma obra usando material menos eficiente e
mais caro, certamente seria processado por improbidade. Mas, o meio jurídico vem
entendendo que o prefeito pode optar por usar um meio ineficiente e caro
(execução fiscal), o qual custa em torno R$ 4.000,00 para o erário e R$ 1500,00
para o devedor (custas e honorários), mas tem eficiência de menos de 20%,
enquanto não usa o protesto fiscal que tem custo zero para o erário, e apenas R$
100,00 para o devedor, e tem 80% de eficiência, e entendem que isto não é
improbidade. Contudo, esta situação pode gerar muito mais prejuízo do que o
exemplo da construção, pois são milhares de processos judiciais por mês.
Exemplificando, em uma situação real em uma cidade mineira de médio porte,
com cem mil habitantes, há 7.000 execuções fiscais do Município em andamento.
Considerando que cada execução fiscal custe 4.000,00, conforme dados do CNJ e
IPEA. Isto implica em um valor de gasto aproximado de R$ 28.000.000,00 (vinte e
oito milhões de reais). Porém, o Município vem conseguindo êxito em apenas 10%
das execuções fiscais. O pior de tudo é que os valores cobrados giram em torno
de R$ 500,00 a 1.000,00, mas a ação custa R$ 4.000,00 para o Estado de Minas
Gerais, e este fica com toda a despesa, pois Município não paga custa.
Normalmente são dividas de IPTU e ISS, e quando os devedores vão quitar têm
que pagar, além do débito, os honorários de sucumbência para os advogados do
Município, além disso têm que pagar as custas em torno de R$ 1.200,00 e pagar a
contratação de um advogado particular para fazer a defesa.
Se fosse a cobrança na modalidade de protesto fiscal o devedor pagaria
apenas R$ 100,00 de emolumentos, mais o débito, ou seja, bem mais barato. E o
Estado não teria despesa alguma.
Contudo, alguns advogados de entes públicos como recebem os honorários de sucumbência temem perder esta receita e até mesmo reduzir os seus quadros, pois remeter guia para protesto fiscal não é ato privativo de advogado, mas assinar petição de execução fiscal, sim.
Contudo, alguns advogados de entes públicos como recebem os honorários de sucumbência temem perder esta receita e até mesmo reduzir os seus quadros, pois remeter guia para protesto fiscal não é ato privativo de advogado, mas assinar petição de execução fiscal, sim.
Lado outro, alguns advogados particulares recebem para fazer a defesa dos
seus clientes, e este mercado representa 30% das ações em andamento no país.
Portanto, os lobbies são intensos.
Em geral, as chances de o devedor obter êxito em ações de execução fiscal são mínimas, pois a dívida decorre de previsão lei e baseia-se no pagamento do tributo ou multa. Além do mais, o protesto fiscal não impede o uso de meios judiciais para combater eventuais irregularidades no crédito e o próprio Titular do Cartório de Protestos faz uma análise do título antes de protestar.
Em geral, as chances de o devedor obter êxito em ações de execução fiscal são mínimas, pois a dívida decorre de previsão lei e baseia-se no pagamento do tributo ou multa. Além do mais, o protesto fiscal não impede o uso de meios judiciais para combater eventuais irregularidades no crédito e o próprio Titular do Cartório de Protestos faz uma análise do título antes de protestar.
Lado outro, quem deve tem que pagar, isto é o princípio básico da
moralidade e da responsabilidade social. Não faz sentido que os bons pagadores
tenham que ser novamente sacrificados com aumentos de impostos para suportar a
inadimplência dos devedores. Além disso, a execução fiscal onera o Estado ( e os
bons pagadores) com a necessidade de se criar mais varas judiciais, o que é
muito mais caro do que implantar órgãos administrativos ou instalar cartórios
extrajudiciais.
Enfim, o protesto fiscal tem vantagens e o Administrador que opta pela via
da execução fiscal comete, em tese, ato de improbidade por violar o princípio
constitucional da eficiência.
André Luís Alves de Melo é mestre em Direito Social e
promotor de Justiça em Minas Gerais.