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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

NOVO OLHAR SOBRE A COISA JULGADA TRIBUTÁRIA

Valor Econômico-29/08/2011.
Luana Vargas Macedo
Tão logo divulgado o Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2011 - aprovado pelo ministro de Estado da Fazenda -, surgiram inúmeras vozes analisando, discutindo e, algumas delas, criticando o seu conteúdo. Nada mais natural, dada a relevância do tema nele tratado; e nada mais salutar, pois é certo que o debate, no qual resta implícito o exercício do direito de crítica, permite que se compreenda melhor o objeto discutido e se perceba, com mais nitidez, os seus desdobramentos, especialmente os de ordem prática.
Ocorre que o debate travado em torno o Parecer nº 492 tem trazido à tona temas que não se identificam com aquele efetivamente por ele tratado, o que termina por dificultar a exata compreensão do seu verdadeiro objeto, tornando o debate um tanto "fora de foco". Tem sido comum, por exemplo, associar a tese defendida no parecer com a polêmica tese da "relativização da coisa julgada inconstitucional", afirmando-se que, através dele, a PGFN pretende legitimar cobranças em desrespeito à coisa julgada, como se a finalidade subjacente à sua elaboração fosse a de "arrecadar a todo custo". Nada mais equivocado.
Ora, "relativizar" a coisa julgada contrária à posterior jurisprudência do STF significa rever ou desconsiderar os seus efeitos pretéritos, já produzidos antes do advento do precedente da Corte. É o que pode ocorrer, por exemplo, por meio da ação rescisória e da impugnação à execução de sentença (arts. 485 e 475-L, parágrafo 1º do CPC, respectivamente). Não é isso, nem de longe, o que defende o parecer.
Não é verdade que o parecer 492 promove a relativização da coisa julgada
Nele, defende-se, apenas, que: (i) as decisões transitadas em julgado que disciplinam relações jurídicas tributárias continuativas deixam de produzir efeitos a partir do momento em que alteradas as circunstâncias fáticas/jurídicas existentes ao tempo da sua prolação e que; (ii) o advento de alguns precedentes do STF configura uma circunstância jurídica nova, capaz de fazer cessar a eficácia vinculante dessas decisões transitadas em julgado, o que permite, por exemplo, que se realizem cobranças tributárias em relação a fatos geradores ocorridos após o advento do precedente do STF, e não antes dele.
E a afirmação posta no item "i" acima não representa qualquer novidade: ela se funda na cláusula "rebus sic stantibus" subjacente às sentenças em geral, cuja existência, que pode ser considerada como uma natural consequência do que se entende por "limites objetivos" da coisa julgada, não acarreta, sob qualquer ótica, a sua "relativização".
A afirmação posta no item "ii", por sua vez, também não pode ser considerada uma novidade por completo. É que há muito a doutrina e a jurisprudência pátria têm considerado que os precedentes do STF, formados em controle concentrado ou difuso de constitucionalidade, neste último caso, desde que seguidos por Resolução do Senado, configuram circunstâncias jurídicas novas capazes de alterar o sistema jurídico vigente, o que as torna aptas a fazer cessar a eficácia vinculante das anteriores decisões transitadas em julgado que lhes forem contrárias. Até aí, portanto, não há nenhuma novidade.
O que o parecer realmente traz de novo é a tese de que algumas decisões proferidas pelo STF em controle difuso de constitucionalidade, mesmo que não seguidas por Resolução Senatorial, também possuem o condão de fazer cessar a eficácia vinculante das anteriores coisas julgadas. Parte-se do pressuposto de que, dada a atribuição, conferida ao STF, de proferir a palavra final acerca da compatibilidade das leis com a Constituição, os precedentes oriundos do seu Plenário, quando submetidos ao art. 543-B do CPC, ostentam os atributos da objetividade e da definitividade, de modo que o seu advento possui o condão de conferir à norma por eles apreciada um atributo novo: a condição de norma definitivamente interpretada pelo órgão responsável por dar a palavra final sobre o tema. Sob essa ótica, o advento desses precedentes impacta, de certo modo, o sistema jurídico vigente.
Pode-se até discordar dessa tese, mas uma coisa é certa: ela se encontra em compasso com a tendência de se aproximar a natureza, e, até mesmo, a extensão da eficácia vinculante das decisões proferidas pelo STF nas duas modalidades de controle de constitucionalidade, naquilo que se tem denominado de "objetivação do controle de constitucionalidade das leis". Ao seguir essa tendência, o parecer presta tributo à força normativa da Constituição, além de prestigiar, em seu grau máximo, a autoridade dos precedentes oriundos da Suprema Corte.
Essa atitude já vinha sendo observada pela PGFN em sua atuação judicial e, com o parecer, passa a ser a postura adotada por toda a Administração Tributária Federal. Em termos práticos e simplificados, isso significa dizer que, a partir do parecer, ao Fisco Federal restará vedada a realização de cobranças de tributos declarados inconstitucionais pelo STF, seja em controle concentrado, seja em controle difuso de constitucionalidade, quando observado o art. 543-B do CPC.
Não é verdade, portanto, que o parecer nº 492 promove a relativização da coisa julgada: diversamente, a tese nele contida funda-se, simplesmente, na ideia de limites objetivos da coisa julgada. Também não é verdade que, com o parecer, a PGFN pretende "arrecadar a qualquer custo": ora, como o parecer aplica-se tanto contra, quanto a favor da Fazenda, os reflexos práticos por ele gerados certamente podem ser diretamente benéficos tanto para o Fisco, quanto para os contribuintes. Em realidade, ao final dessa equação, só há ganhos, na medida em que, através dela, saem fortalecidos valores caros à sociedade brasileira, como a isonomia, a justiça, a força normativa da Constituição e o respeito à autoridade das decisões do STF.
E esse entendimento pode, naturalmente, ser criticado, mas os argumentos utilizados para refutá-lo devem focar-se no seu real objeto, sob pena de se desvirtuar o debate, impedindo-se, assim, que se apreenda o verdadeiro alcance prático do parecer.
Luana Vargas Macedo é procuradora da Fazenda Nacional

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38 - A Responsabilidade Tributária "Pessoal" Prevista no Código Tributário Nacional. in Revista Pensamento Jurídico - São Paulo - vol. 16, nº 1, jan./abr. 2022 . p. 90 - 123 - ISSN 321-1039-1 ______ 37. Arbitragem em Matéria Tributária. in Revista de Direito Tributário Contemporâneo. Ano 7. Vol. 32. jan./mar.2022. Coordenação Paulo de Barros Carvalho. p. 293 - 307. ISSN 2525-4626 ______ 36 - Reserva de Lei Complementar para Dispor sobre Prescrição Intercorrente em Matéria Tributária: Análise do RE 636.562-SC. in XVII Congresso Nacional de Estudos Tributários: Meio Século de Tradição. Coordenação Paulo de Barros Carvalho; Organização Priscila de Souza. 1ª ed. São Paulo: Noeses: IBET, 2021. p. 1247-1258 - ISBN 978-65-89888-29-1 ______ 35 - A Função da Lei Complementar 116/2003 e Dispor Sobre Conflito de Competência entre os Municípios. in Direito Constitucional Tributário e Tributação Municipal: Estudos em Homenagem à Professora Elisabeth Nazar Carrazza. Organizadore: Anselmo Zilvet Abreu, Carlos Augusto Daniel Neto, Marcio Cesar Costa. São Paulo: Quartier Latin, 2021. p. 505-516 - ISBN 97-8655-575-076-8. ______ 34 - A Responsabilidade Tributária dos Administradores e dos Sócios. in Compêndio de contabilidade e direito tributário: volume I: contabilidade. Organizadores: Luis Alberto Buss Wulff Junior, Luiz Alberto Pereira Filho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2021. p. 43-51 - ISBN 978-65-5510-551-3. ______ Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário como Hipótese de Suspensão do Prazo de Prescrição. in Estudos de Direito Tributário: homenagem a José Eduardo Soares de Melo. Organização de Eduardo Soares de Melo. São Paulo: Malheiros, 2020. p. 697-706 - ISBN 978-85-392-0459-5.

32 - Autocomposição na Administração Pública em Matéria Tributária. Revista de Doutrina Jurídica - RDJ (online), v. 111, p. 186-363, 2020 - ISS 2675-9640 - link: https://revistajuridica.tjdft.jus.br/index.php/rdj/article/view/578

31- Breves Comentários do Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça sobre Prescrição Intercorrente em Matéria Tributária. in O Supremo Tribunal de Justiça e a aplicação do direito: estudos em homenagem aos 30 anos do Tribunal da Cidadania. Coordenação Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho e Daniel Octávio Silva Marinho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020. p.581-591 - INSB 978-65-5510-146-1

30- La Posibilidad de Soluciones Alternativas De Controversias en el Derecho Tributario. in Revista Estudios Privados ZavaRod Institute. Ano VII – nª 07/2020 – Segunda Época – pág. 112-120; Versión Digital www.zavarod.com.

29- La Responsabilidad Tributaria del Administrador de Fondos de Inversión. in Revista Estudios Privados ZavaRod Institute. Ano VII – nª 07/2020 – Segunda Época – pág. 209-221; Versión Digital www.zavarod.com.

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27. A execução contra a Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial de acordo com o art. 910 do Código de Processo Civil (co-autoria com Ana Paula Martinez). in Processo de Execução e Cumprimento de Sentença: temas atuais e controvertidos. Coordenação Araken de Assis e Gilberto Gomes Bruschi. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020. p. 919-924 - ISBN 978-65-5065-285-2.

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24. Constructivismo Lógico Semântico. in Constructivismo lógico-semântico: homenagem aos 35 anos do grupo de estudos de Paulo de Barros Carvalho. Coordenação de Paulo de Barros Carvalho; organização Jacqueline Mayer da Costa Ude Braz. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2020. p. 233-251 - ISBN 978-85-8310-143-7

23. Responsabilidade Tributária do Administrador de Fundos de Investimento. in Constructivismo lógico-semântico e os diálogos entre a teoria e prática. Coordenação Paulo de Barros Carvalho; organização: Priscila de Souza. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2019. p.1095-1110 - ISBN 978-85-8310-142-0

22. A possibilidade de soluções alternativas de controvérsias no Direito Tributário in Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu. Ano 6 - nº 07 - 1º semestre de 2019 - ISBN 2358-6990 - - https://www.usjt.br/revistadireito/numero-7.html

21. Prazo de Decadência das Contribuições Previdenciárias Executadas de Ofício Na Justiça do Trabalho. in 30 anos da Constituição Federal e o Sistema Tributário Brasileiro. Organização Priscila de Souza; Coordenação Paulo de Barros Carvalho. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 987 - 1009.

20. Nova interpretação do STJ sobre prescrição intercorrente em matéria tributária in conjur.com.br (28.11.2018)

19. Uma Nova Visão Para um Velho Assunto: Decadência e Prescrição no Direito Tributário, in Normas Gerais de Direito Tributário: Estudos em Homenagem aos 50 anos do Código Tributário Nacional. Coord. Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho. Curitiba: Editora CRV, 2016. p. 537-549.

18. A Lei Complementar e a Função de Solucionar Conflito de Competência em Matéria Tributária. in 50 Anos do Código Tributário Nacional. Org. Priscila de Souza; Coord. Paulo de Barros Carvalho. 1 ed. São Paulo: Noeses: IBET, 2016. p.1087-1098.

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14. O Direito à Repetição do Indébito do ICMS: Aplicação do Art. 166 do CTN. In: Betina Treiger Grupenmacher; Demes Brito; Fernanda Drummond Parisi. (Org.). Temas Atuais do ICMS. 1ed.São Paulo: IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda, 2015, v. 01, p. 01-494.

13.Uma nova visão sobre Decadência e Prescrição no Direito Tributário. In: Fernanda Drummond Parisi; Heleno Taveira Torres; José Eduardo Soares de Melo. (Org.). Estudos de Direito Tributário em Homenagem ao Professor Roque Antônio Carrazza. 1ed.São Paulo: Malheiros Editores, 2014, v. 1, p. 612-626.

12.O início da Fiscalização como Demarcação do Prazo de Decadência do Crédito Tributário. In: Paulo de Barros Carvalho; Priscila de Souza. (Org.). O Direito Tributário: Entre a Forma e o Conteúdo. 1 ed.São Paulo: Editora Noeses, 2014, v. 1, p. 1-1158.

11. O Supremo Tribunal Federal: Órgão Jurídico (não político). Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu, http://www.usjt.br/revistadire, p. 01 - 249, 01 mar. 2014.

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9.Impossibilidade de incidência nas importações de serviço. In: Alberto Macedo e Natalia De Nardi Dacomo. (Org.). ISS Pelos Conselheiros Julgadores. 1ed.SÃO PAULO: Quartier Latin, 2012, v. 1, p. 429-438.

8. Penhora on line em Matéria Tributária, aplicação do art. 185-A do Código Tributário Nacional - CTN. Enfoque Jurídico - Ano I - Edição 2 - Abril/2011, São Paulo, p. 8 - 8, 01 abr. 2011.

7.Norma Jurídica: paralelo entre a teoria normativista- positivista clássica e a teoria comunicacional. In: Gregorio Robles; Paulo de Barros Carvalho. (Org.). Teoria Comunicacional do Direito: Diálogo entre Brasil e Espanha. 1ed.São Paulo: Noeses, 2011, v. 1, p. 3-649.

6. Lacunas no Sistema Jurídico e as Normas de Direito Tributário. Revista de Direito Tributário 109/110. Malheiros Editores, 2010.

5. Meio Eletrônico Utilizado para garantir a efetividade na cobrança do crédito tributário: penhora on line. Direito Tributário Eletrônico, Editora Saraiva, 2010.

4. La modulación de efectos de la decisión en el control de constitucionalidad brasileña. Revista Opciones Legales -Fiscales, Edição Especial, Junio 2010, México. E edição normal de venda, México, junio 2010.

3. Tradução e Direito:Contribuição de Vilém Flusser e o dialogismo na Teoria da Linguagem. Vilém Flusser e Juristas. Editora Noeses, 2009.

2. Modulação dos efeitos da decisão em matéria tributária: possibilidade ou não de “restringir os efeitos daquela declaração”. Revista Dialética de Direto Tributário (RDDT). v.170, p.52-63, 2009.

1. Concessão de Medida Cautelar em Controle de Constitucionalidade Concentrado e seus Efeitos em Matéria Tributária. Revista da Escola Paulista de Direito. Editora Conceito, 2009. v.7, p.05 - 449.

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