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terça-feira, 30 de julho de 2019

Solução de Consulta 198 da Receita afronta jurisprudência do STJ


Consultor Jurídico - 22/07/2019 

Por Pedro Becker Calheiros Correia de Melo

Com o passar do tempo, vem ficando cada vez mais claro o distanciamento do Estado em suas decisões quanto à aplicação dos preceitos que norteiam o ordenamento brasileiro. Isso porque inúmeras decisões tomadas nos últimos tempos desconsideram os princípios e a natureza dos objetos sob análise.

A Receita Federal firmou entendimento na Solução de Consulta 128, datada de 5 de novembro de 2018[1], que não haverá a incidência de Imposto Territorial Rural (ITR) sobre imóveis rurais que se situem dentro da zona urbana, devendo, desta forma, haver a incidência de Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), mesmo quando comprovada a finalidade rural do imóvel.

Tal entendimento afronta diretamente as diretrizes estabelecidas pelo Superior Tribunal de Justiça, quando da análise dessa matéria em sede de recurso repetitivo, nos autos do Recurso Especial 1.112.646-SP, de relatoria do ministro Herman Benjamin, da 1ª Turma (Tema 174), que fixou a tese de que “não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial”.

Nesse ponto, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça trouxe entendimento extensivo ao que dispõe o texto constitucional sobre o ITR, ex vi artigo 153, inciso VI, da Carta Magna, de modo que haverá a incidência desse inclusive quando localizados os imóveis dentro da zona urbana do município.

Sob essa ótica da Receita Federal, a natureza do ITR e o princípio da função social da propriedade estão sendo desconsideradas, contrariando disposição expressa, consoante entendimento firmado pelo STJ no recurso repetitivo retromencionado.

Ora, quando se trata de tributação de imóveis, tanto no IPTU quanto no ITR verifica-se que o princípio da função social do imóvel predomina em ambas as realidades. Seja na progressividade da alíquota do IPTU, utilizada para desestimular a prática de manutenção de propriedades improdutivas por seus proprietários, quanto na tese firmada no REsp 1.112.646-SP, cuja controvérsia foi dirimida a partir da análise do exposto pelo Decreto-Lei 57/1966.

A função social da propriedade é um princípio privilegiado pelo texto constitucional, visto que o decreto-lei citado (recepcionado com caráter de lei complementar) o utilizou como critério de delimitação de competência entre os conflitos existentes entre a União (ITR) e municípios (IPTU), pois o referido ato entende que não se aplica o disposto no artigo 32 do Código Tributário Nacional aos imóveis que, comprovadamente, sejam utilizados em atividade rural, devendo incidir, desse modo, o ITR.

Cumpre salientar que o DL 57/1966 não suprimiu o artigo 32 do Código Tributário Nacional, que traz o critério territorial como premissa de incidência de tributos sobre imóveis, onde a localização em área classificada como urbana, por lei municipal, seria o único parâmetro utilizado para a atribuição da competência de tributar esses bens aos municípios.

Ao dirimir a controvérsia acerca do conflito de competência territorial, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que a destinação do imóvel prevista pelo DL 57/1966 deve ser utilizada como critério delimitador da incidência tributária sobre estes bens, ao passo que a sua aplicação deve ser realizada de forma conjunta ao critério espacial previsto no artigo 32 do CTN.

Assim, tendo em vista que a jurisprudência se encontra pacificada, ao reconhecerem a finalidade do bem para a clara delimitação da incidência tributária sobre imóveis, a Solução de Consulta 198 se demonstra incompleta, quiçá ilegal, visto que deixou de observar a incidência do decreto-lei na matéria sob análise.

Portanto, verifica-se que a incompletude da referida solução resultou na usurpação dos direitos constitucionais do particular pela foice estatal das decisões notoriamente opressoras sob o manto protetor emanado pelo princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, constantemente utilizado para justificar as arbitrariedades cometidas pelo Estado, restando aos contribuintes apenas aguardar o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre esta controvérsia.

[1] Decisão publicada no Diário Oficial da União em 26 de novembro de 2018, Seção 01, página 25.

Minhas publicações em revistas, livros e sites:

38 - A Responsabilidade Tributária "Pessoal" Prevista no Código Tributário Nacional. in Revista Pensamento Jurídico - São Paulo - vol. 16, nº 1, jan./abr. 2022 . p. 90 - 123 - ISSN 321-1039-1 ______ 37. Arbitragem em Matéria Tributária. in Revista de Direito Tributário Contemporâneo. Ano 7. Vol. 32. jan./mar.2022. Coordenação Paulo de Barros Carvalho. p. 293 - 307. ISSN 2525-4626 ______ 36 - Reserva de Lei Complementar para Dispor sobre Prescrição Intercorrente em Matéria Tributária: Análise do RE 636.562-SC. in XVII Congresso Nacional de Estudos Tributários: Meio Século de Tradição. Coordenação Paulo de Barros Carvalho; Organização Priscila de Souza. 1ª ed. São Paulo: Noeses: IBET, 2021. p. 1247-1258 - ISBN 978-65-89888-29-1 ______ 35 - A Função da Lei Complementar 116/2003 e Dispor Sobre Conflito de Competência entre os Municípios. in Direito Constitucional Tributário e Tributação Municipal: Estudos em Homenagem à Professora Elisabeth Nazar Carrazza. Organizadore: Anselmo Zilvet Abreu, Carlos Augusto Daniel Neto, Marcio Cesar Costa. São Paulo: Quartier Latin, 2021. p. 505-516 - ISBN 97-8655-575-076-8. ______ 34 - A Responsabilidade Tributária dos Administradores e dos Sócios. in Compêndio de contabilidade e direito tributário: volume I: contabilidade. Organizadores: Luis Alberto Buss Wulff Junior, Luiz Alberto Pereira Filho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2021. p. 43-51 - ISBN 978-65-5510-551-3. ______ Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário como Hipótese de Suspensão do Prazo de Prescrição. in Estudos de Direito Tributário: homenagem a José Eduardo Soares de Melo. Organização de Eduardo Soares de Melo. São Paulo: Malheiros, 2020. p. 697-706 - ISBN 978-85-392-0459-5.

32 - Autocomposição na Administração Pública em Matéria Tributária. Revista de Doutrina Jurídica - RDJ (online), v. 111, p. 186-363, 2020 - ISS 2675-9640 - link: https://revistajuridica.tjdft.jus.br/index.php/rdj/article/view/578

31- Breves Comentários do Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça sobre Prescrição Intercorrente em Matéria Tributária. in O Supremo Tribunal de Justiça e a aplicação do direito: estudos em homenagem aos 30 anos do Tribunal da Cidadania. Coordenação Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho e Daniel Octávio Silva Marinho. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020. p.581-591 - INSB 978-65-5510-146-1

30- La Posibilidad de Soluciones Alternativas De Controversias en el Derecho Tributario. in Revista Estudios Privados ZavaRod Institute. Ano VII – nª 07/2020 – Segunda Época – pág. 112-120; Versión Digital www.zavarod.com.

29- La Responsabilidad Tributaria del Administrador de Fondos de Inversión. in Revista Estudios Privados ZavaRod Institute. Ano VII – nª 07/2020 – Segunda Época – pág. 209-221; Versión Digital www.zavarod.com.

28- El Problema que Provoca la Modulación de los Efectos de las Decisiones Emitidas en el Control de Constitucionalidad en Materia Tributaria. in Revista Estudios Privados ZavaRod Institute. Ano VII – nª 07/2020 – Segunda Época – pág. 300-313; Versión Digital www.zavarod.com.

27. A execução contra a Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial de acordo com o art. 910 do Código de Processo Civil (co-autoria com Ana Paula Martinez). in Processo de Execução e Cumprimento de Sentença: temas atuais e controvertidos. Coordenação Araken de Assis e Gilberto Gomes Bruschi. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020. p. 919-924 - ISBN 978-65-5065-285-2.

26. Modulação dos Efeitos da Decisão: Razões de (in)Segurança Jurídica. in Texto e Contexto no Direito Tributário. Coordenação Paulo de Barros Carvalho; Organização Priscila de Souza. 1ª ed. São Paulo: Noeses: IBET, 2020. p. 1113-1123 - ISBN 978-65-992879-3-0

25. O grave Problema da Técnica de Modulação dos Efeitos das Decisões Proferidas em Controle de Constitucionalidade em Matéria Tributária. in Novos Rumos do Processo Tributário: Judicial, Administrativo e Métodos Alternativos de Cobrança do Crédito Tributário, vol.1; coordenação de Renata Elaine Silva Ricetti Marques e Isabela Bonfá de Jesus. São Paulo: Editora Noeses,2020, p. 767-783.

24. Constructivismo Lógico Semântico. in Constructivismo lógico-semântico: homenagem aos 35 anos do grupo de estudos de Paulo de Barros Carvalho. Coordenação de Paulo de Barros Carvalho; organização Jacqueline Mayer da Costa Ude Braz. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2020. p. 233-251 - ISBN 978-85-8310-143-7

23. Responsabilidade Tributária do Administrador de Fundos de Investimento. in Constructivismo lógico-semântico e os diálogos entre a teoria e prática. Coordenação Paulo de Barros Carvalho; organização: Priscila de Souza. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2019. p.1095-1110 - ISBN 978-85-8310-142-0

22. A possibilidade de soluções alternativas de controvérsias no Direito Tributário in Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu. Ano 6 - nº 07 - 1º semestre de 2019 - ISBN 2358-6990 - - https://www.usjt.br/revistadireito/numero-7.html

21. Prazo de Decadência das Contribuições Previdenciárias Executadas de Ofício Na Justiça do Trabalho. in 30 anos da Constituição Federal e o Sistema Tributário Brasileiro. Organização Priscila de Souza; Coordenação Paulo de Barros Carvalho. 1ª ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 987 - 1009.

20. Nova interpretação do STJ sobre prescrição intercorrente em matéria tributária in conjur.com.br (28.11.2018)

19. Uma Nova Visão Para um Velho Assunto: Decadência e Prescrição no Direito Tributário, in Normas Gerais de Direito Tributário: Estudos em Homenagem aos 50 anos do Código Tributário Nacional. Coord. Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho. Curitiba: Editora CRV, 2016. p. 537-549.

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11. O Supremo Tribunal Federal: Órgão Jurídico (não político). Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu, http://www.usjt.br/revistadire, p. 01 - 249, 01 mar. 2014.

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8. Penhora on line em Matéria Tributária, aplicação do art. 185-A do Código Tributário Nacional - CTN. Enfoque Jurídico - Ano I - Edição 2 - Abril/2011, São Paulo, p. 8 - 8, 01 abr. 2011.

7.Norma Jurídica: paralelo entre a teoria normativista- positivista clássica e a teoria comunicacional. In: Gregorio Robles; Paulo de Barros Carvalho. (Org.). Teoria Comunicacional do Direito: Diálogo entre Brasil e Espanha. 1ed.São Paulo: Noeses, 2011, v. 1, p. 3-649.

6. Lacunas no Sistema Jurídico e as Normas de Direito Tributário. Revista de Direito Tributário 109/110. Malheiros Editores, 2010.

5. Meio Eletrônico Utilizado para garantir a efetividade na cobrança do crédito tributário: penhora on line. Direito Tributário Eletrônico, Editora Saraiva, 2010.

4. La modulación de efectos de la decisión en el control de constitucionalidad brasileña. Revista Opciones Legales -Fiscales, Edição Especial, Junio 2010, México. E edição normal de venda, México, junio 2010.

3. Tradução e Direito:Contribuição de Vilém Flusser e o dialogismo na Teoria da Linguagem. Vilém Flusser e Juristas. Editora Noeses, 2009.

2. Modulação dos efeitos da decisão em matéria tributária: possibilidade ou não de “restringir os efeitos daquela declaração”. Revista Dialética de Direto Tributário (RDDT). v.170, p.52-63, 2009.

1. Concessão de Medida Cautelar em Controle de Constitucionalidade Concentrado e seus Efeitos em Matéria Tributária. Revista da Escola Paulista de Direito. Editora Conceito, 2009. v.7, p.05 - 449.

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